Peter Hook toca "Low Life" e "Brotherhood" no Clash Club (SP)
Foto: Manuela Scarpa / Photo Rio News
E Peter Hook e seu The Light voltaram ao Brasil e apresentaram na última sexta, dia 31/10, seu mais novo show, Performing New Order’s “Low Life” & “Brotherhood" Live, no Clash Club, em São Paulo. O bairro da Barra Funda, uma antiga e hoje decadente zona industrial, deve ter caído como uma luva como localização para o show, nem que fosse em termos "conceituais", já que o ambiente local certamente remetia aos arredores do extinto Factory Club, em Manchester, um lugar que faz parte da história não apenas da estrela do espetáculo, como também de seus ex-companheiros de Joy Division e New Order (agora desafetos) e dos falecidos Ian Curtis, Martin Hannett, Tony Wilson e Rob Gretton, os homenageados da noite.
A formação do The Light que bateu o cartão no Clash Club desta vez foi a mesma que compareceu ao Cine Jóia em outubro do ano passado com o show Performing New Order’s “Movement" & “Power, Corruption & Lies” Live: Jack Bates, filho de Peter Hook, no papel do segundo baixista; David Potts, ex-parceiro de Hooky no Revenge e no Monaco, na guitarra e nos vocais de apoio; Paul Kehoe, outro egresso do Monaco, na bateria; e Andy Poole nos teclados e nas programações. Todavia, há um ano, ainda que o Cine Jóia, onde o The Light tinha se apresentado, não fosse um lugar grande, a pista e o palco eram ligeiramente mais espaçosos se comparados com os do Clash Club. Nessa última ocasião, ao contrário, o público ficou confinado em uma espécie de corredor estreito, quase um curral, enquanto que a banda teve que se amontoar em um palco minúsculo e de tal maneira que o tecladista Andy Poole teve que se posicionar atrás dos amplificadores do Jack Bates, tornando-se quase invisível. Isso sem falar na péssima iluminação, que deixava vários pontos do palco em zonas escuras, como, por exemplo, o lado onde se encontrava o David Potts.
Por outro lado, esses “detalhes" não comprometeram o show. E que show. É bem verdade que, a princípio, Hooky não parecia de tão alto astral quanto da última vez que esteve em São Paulo. Quem viu, deve se lembrar: muitas poses para os celulares e para os fotógrafos da imprensa, sorrisinhos e piscadelas para a platéia, aquela fanfarronice de sempre. O Peter Hook do Clash Club tinha um semblante um pouco mais “sério”, o que não quer dizer que o baixista estava apático ou sem tesão de tocar. Pelo contrário.
O primeiro set do show se concentrou inteiramente no Joy Division. Abriram em tom fúnebre, com “Atmosphere”, que foi dedicada a um amigo de Hooky morto naquela semana. Mas em seguida veio chumbo grosso, com “Transmission”. Depois, “Ceremony" - provavelmente sua melhor e mais vigorosa versão pelo The Light se compararmos as três vindas da banda-tributo ao Brasil. O público foi brindado ainda com “Disorder”, “Isolation”, “She’s Lost Control” e “Shadowplay”. Resumindo: imagine um time terminando o primeiro tempo ganhando a partida por 3 x 0. É mais ou menos isso.
Após uma pausa, o The Light retornou ao palco sem Peter Hook para tocar uma das obscuridades do repertório do New Order: a versão instrumental da faixa “Let's Go”, usada na trilha-sonora do filme “Salvation!”, de Beth B., em 1987. Ao fim desta, o “bassgod" enfim deu as caras novamente para a execução de “Thieves Like Us”. Apesar da excelente atuação instrumental, ficou evidente a inadequação das caracteríscas vocais de Peter Hook para o repertório do New Order. Em muitas outras canções a partir daí ficou a impressão de que os vocais e os instrumentos estavam em tons totalmente diferentes, já que Hooky por vezes parecia evitar (ou não conseguia alcançar) notas mais agudas.
Após “Thieves Like Us”, eis que a banda finalmente começou a esperada execução de Low Life, um dos melhores álbuns da carreira do New Order. A partir de então fica dificil destacar os melhores momentos. “Love Vigilantes”, como era de se esperar, arrebatou o público; “The Perfect Kiss”, apesar de alguns synths soarem como barulinhos de games, ganhou uma ótima versão, com destaque, obviamente, para Peter Hook, que ao final da música mandou um recado para seu substituto no New Order, Tom Chapman: “é assim que se toca ‘The Perfect Kiss’!”; já “This Time of Night” pode ser considerada um dos destaques, com sua batida pesada e programações atualizadas; “Elegia” emocionou mais pelo solo de baixo de seis cordas com Hooky sentado em um banquinho (ao estilo João Gilberto) do que pelo som “embolado" dos sintetizadores; “Sooner Than You Think” trouxe David Potts nos vocais principais - e em um momento oportuno, pois nessa altura do show Peter Hook já estava ficando sem voz e quase inaudível; “Subculture" saiu soberba e perfeita.
Após “Face Up”, outra pausa. Mas ninguem precisou esperar muito, foram apenas uns minutinhos. “Paradise" abriu o bloco Brotherhood. Não chegou com grande impacto e a voz de Peter Hook não passava de um fiapo. A sorte é que David Potts dava uma forcinha nos vocais de apoio. Com a música seguinte, “Weirdo”, começou a pairar no ar uma impressão de que a apoteose que havia sido até então corria o risco de se transformar em um fiasco. Felizmente, não foi o que aconteceu. Com a bela versão de “As It Is When It Was” o trem se realinhou nos trilhos e a banda conseguiu terminar o “Lado A” com competência.
Mas todos queriam ouvir mesmo era o “Lado B”, mais eletrônico e dançante. E quando ele começou, com a ansiosamente aguardada “Bizarre Love Triangle”, já não importava mais se Hooky mal conseguia cantar porque a plateia assumiu a plenos pulmões essa função - como se isso fosse alguma novidade… Em seguida vieram “All Day Long” (belíssima), “Angel Dust” (com uma surpreendente e poderosa versão ao vivo) e “Every Little Counts” (um antigo clássico que, infelizmente, o New Order deixou para trás em seus shows). Enfim, Brotherhood, considerado por muitos um disco menos sofisticado que Low Life devido a uma produção, digamos, “menos rigorosa”, mostrou sua verdadeira força ao vivo, ainda que não tenha sido pelas mãos do New Order.
Nova pausa, nova espera. Em seu último retorno ao palco, uma surpresa: os músicos, exceto Jack, vestiam camisetas da seleção brasileira personalizadas com seus nomes. Foram dadas de presente por um fã poucas horas antes, após o soundcheck. Em retribuição, tocaram o hit do New Order que mais tem afinidade com o batidão das favelas e periferias de Rio de Janeiro e São Paulo: “Confusion”. O público vibrou e cantou junto. Em seguida, veio “Shellshock”, cujo refrão também foi acompanhado pela plateia. Quando parecia que não podia ficar melhor, Hooky e seus escudeiros soltaram “True Faith” - e o Clash Club veio abaixo. O gran finale chegou com “Temptation”. Foi aí que Peter Hook foi mais Peter Hook do que nunca - ou foi o mesmo de sempre. Foi à beira do palco, fez poses, caras e bocas, deixou que o tocassem, quase acertou o braço do baixo na cabeça de alguem na primeira fila e por aí vai. Quando os instrumentos silenciaram, tirou a camiseta amarelinha e atirou-a para o público, no melhor estilo superstar.
Não deixa de ser um curioso paradoxo: de um lado, o baixista que sempre teve o ego de uma superestrela de rock e é idolatrado como se fosse um deus tocando em pequenos espaços alternativos equanto que, do outro, seus ex-companheiros, sempre avessos ao assédio e com notórias falta de carisma e presença de palco se apresentam para grandes plateias. Em comum, o mesmo repertório - ou quase. Que diferença que a posse de um nome faz.
SET LIST:
Atmosphere (Joy Division)
Transmission (Joy Division)
Ceremony (Joy Division / New Order)
Disorder (Joy Division)
Isolation (Joy Division)
She's Lost Control (Joy Division)
Shadowplay (Joy Division)
Let's Go
Thieves Like Us
Love Vigilantes
The Perfect Kiss
This Time of Night
Sunrise
Elegia
Sooner Than You Think
Sub-Culture
Face Up
Paradise
Weirdo
As It Is When It Was
Broken Promise
Way of Life
Bizarre Love Triangle
All Day Long
Angel Dust
Every Little Counts
Confusion (encore)
Shellshock (encore)
True Faith (encore)
Temptation (encore)
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