Decifrando as Capas - Parte II: Waiting for the Sirens' Call (2005) / Lost Sirens (2013)

30/01/2014 10:54

A capa do álbum Waiting for the Sirens’ Call, lançado em 2005, esconde uma interessante história por trás da sua simplicidade e aparente falta de inspiração. Lembro-me bem que, na ocasião em que a capa do CD foi divulgada na internet, um amigo, fã de rock progressivo (gênero conhecido por uma comunicação visual de gosto duvidoso e um tanto quanto espalhafatosa às vezes) expressou, com surpresa: “Mas isso é a capa?”. Realmente, não havia nada demais. Aliás, não havia praticamente nada mesmo. Trata-se de uma capa totalmente branca, com no nome da banda e o título do disco discretamente escritos no canto superior esquerdo e um chamativo “No” ocupando o centro. E só. Tipografia laranja sobre fundo branco.

Nem era tão mal assim... Quando o disco chegou às lojas e, depois, caiu nas mãos dos fãs, vimos que o projeto gráfico era até bem mais legal do que parecia: o encarte, feito em papel couché fosco de alta gramatura, possuía orelhas na capa e na contracapa, imitando um livro, e páginas especiais com impressão fotográfica para as fotos feitas por Peter Saville (diretor de arte) e Anna Blessman. Um trabalho muito bonito por sinal. Mas questão é: por que a capa em si mesma, isto é, a parte frontal (a que fica exposta publicamente) parecia tão "preguiçosa"?

O fato é que essa não foi a proposta original apresentada pelo designer Peter Saville aos executivos da Warner Brothers na época. Inicialmente, o projeto que Saville submeteu à companhia trazia a foto Tahitian Girl, feita pelo fotógrafo russo Eliot Elisofon em 1955 para a revista de fotojornalismo Life (ver abaixo). Isso mesmo: a foto que posteriormente Saville usou na capa do single “Waiting for the Sirens’ Call”. Mas a o que aconteceu é que a Warner vetou a ideia – só que verdadeira razão para isso até hoje permanece no reino das especulações.

Uma das “teorias” sobre o assunto é que a garota a banhar-se num rio na foto poderia ser confundida com uma “tailandesa” (!!!) e no ano anterior (2004) um tsunami em pleno Oceano Índico arrasou cidades costeiras da Tailândia, Sri Lanka e Indonésia, então o emprego da foto na capa do CD poderia causar algum tipo de mal estar público. Se essa é a história verdadeira, não se sabe ao certo, mas ela já faz parte do folclore neworderiano. O que existe de verdade é que Saville teve que apresentar um novo projeto, só que a Warner não relaxou o prazo. Para cumprir o deadline – afinal, a Warner Bros. não é a Factory Records – Saville e o designer com quem ele estava trabalhando no projeto gráfico do disco na época, Howard Wakefield, resolveram usar o que já estava à mão, isto é, uma imagem que já tinham pronta: aquele logotipo “No”, que certamente são as iniciais de New Order. E foi isso o que entregaram à gravadora.

Curiosamente, o “No” na capa acabou servindo como uma espécie de declaração de Saville aos fãs e protesto contra a falta de flexibilidade da Warner: “No artwork” (sem arte). O que parecia falta de imaginação virou um toque de gênio. Ou, se utilizarmos as palavras dele, mais um segredo produzido em massa. Curiosamente, a foto que Warner recusou para a capa do que veio a ser o oitavo álbum do New Order acabou indo parar, como dissemos, no single homônimo, lançado em setembro do mesmo ano. Inclusive, Saville preparou algo especial para esse lançamento: como “Waiting for the Sirens’ Call” também foi lançado em vinil de 7” triplo, com cada compacto trazendo, no Lado A, um mix diferente da faixa-título e, no Lado B, um remix novinho em folha de uma canção antiga (as escolhidas foram “Temptation”, “Everything’s Gone Green” e “Bizarre Love Triangle”), o mestre do design usou outras duas fotos de Elisofon da mesma garota taitiana (em poses ligeiramente diferentes), as retocou digitalmente para dois dos três vinis e ainda criou uma espécie da pasta de papelão, que era distribuída gratuitamente (apenas na Inglaterra), para guardar os discos.

  

 

Mas a história da capa de Waiting for the Sirens’ Call não termina por aí. A foto de Eliot Elisofon voltou à cena com o lançamento, em 2013, de Lost Sirens, o “EP expandido” (ou “mini-LP”, como preferem alguns) com as sobras de estúdio do álbum de 2005. Os designers Howard Wakefield e Sarah Parris, que assumiram o posto no lugar de Saville, aproveitando um conceito utilizado na campanha “New Order: 30”, que celebrava as três décadas de carreira discográfica do New Order, puseram a Tahitian Girl novamente na capa, mas agora a foto está irreconhecível, em versão ultrapixelada. O que se vê na capa são apenas nove pixels gigantes coloridos.


New Order: 30